domingo, 6 de junho de 2010

"Contra o aquecimento global, planejamento familiar"?

Recentemente recebi de um amigo a postagem (Contra o aquecimento global, planejamento familiar) de Andrea Vialli em 01/06/2010 em seu blog no "estadão". Em busca na internet, lí que um estudo da ONU de final de 2009 apoiava proposta semelhante.

Entendo as boas intenções, mas procurei avaliar a proposta criticamente.

Parti do pressuposto que, para justificar uma proposta como essa, deveria haver alguma correlação entre a contribuição dos países para a população mundial e sua respectiva contribuição nas emissões de dióxido de carbono, o principal gás do efeito estufa.

Rapidamente, para testar essa proposição, peguei da Wikipedia os 15 países com as maiores emissões desse gás [1] e os 15 países com as maiores populações [2], conforme tabela abaixo [3]. Com base nesses dados, testei se existe uma correlação razoável entre a posição dos países no "rank" de população e no de emissões.


A principio imaginava, e o gráfico acima parece confirmar, que a correlação não é das mais fortes. Não é surpreendente, já que sempre correlacionou-se emissão de CO2 com industrialização, e não com tamanho populacional. Entretanto, decidi confirmar com um teste de hipótese [5]. O intervalo de confiança (95%) dessa correlação é entre -0.46 e 0.31, e com "valor de p" de 0.66 para a hipótese alternativa de que a correlação é diferente de 0. Ou seja, se não cometi nenhum erro na análise e os dados da Wikipedia estão corretos, não é possível afirmar que existe alguma correlação entre a contribuição populacional de um país e sua contribuição em termos de emissão de gás carbônico.

Portanto, embora planejamento familiar possa ser importante
no combate a pobreza, não se justifica alguma medida desse tipo, muito menos controle populacional, em nome do combate ao aquecimento global.

Como essa informação pode interessar para outros, decidi postá-la aqui.

Discutindo um pouco o resultado e a questão

Antes de mais nada, é preciso lembrar que o homem criou o estado, e este existe para o primeiro, e não o contrário. A partir do momento em que o homem vivet para o estado, acredito eu, ele deve se rebelar.

Vale a pena ressaltar que planejamento familiar é uma atitude saudável, mas o controle de natalidade é uma imposição e está relacionada com estados autoritários, controladores. Enquanto esse último pode ser exercido sobre uma população de baixo desenvolvimento social, o primeiro não. Pois, uma vez que a população recebe educação e é capaz de planejar seu futuro, essa já é uma população em estágio de desenvolvimento posterior. E sabemos que, uma vez que a população é capaz de planejar seu futuro, ela tende naturalmente a crescer de forma mais controlada, estreitando
sua pirâmide demográfica. Isso não é novidade, é conhecido a tempos como "transição demográfica" e se verifica em vários países. Esses países, inclusive, passam a ter outros problemas, como escassez de mão de obra para serviços gerais e problemas previdenciários.

Por outro lado, se não há correlação entre número de "vidas" e emissão de gás carbônico, a visão tradicional de que a emissão está relacionada com a "qualidade" de vida - também citada no texto a que me referi no início - ganha suporte. Fica ai outro ponto a ser testado.

E justamente essa população desenvolvida, demograficamente auto-controlada, é que mais emite gás carbônico. Mas não precisamos ser poucos e com estilo de vida dos séculos anteriores. Negar o desenvolvimento, esse sim seria um erro, acredito eu. Novo cenário, novos problemas. Um mínimo local talvez. A população instruída precisa superar esse novo obstáculo com desenvolvimento de tecnologias com baixo impacto ambiental, e não impor restrições àqueles que desfrutam condições sociais inferiores.

Assim, acredito eu, cabe aos povos na ponta do desenvolvimento desenvolver essas novas tecnologias e, assim que possível, transmiti-las aos em estágios anteriores. Com educação todos os povos podem se desenvolver autonomamente, respeitando o planeta, a sociedade, mas também respeitando suas liberdades individuais, isto é, respeitando a si mesmo. Não há como respeitar os demais e o planeta se não se permite respeitar a si próprio.

Entretanto, para alcançarmos esse próximo estágio de desenvolvimento, precisamos escolher estratégias que nos tragam o melhor "custo/benefício", e tomar cuidado com qualquer uma com boa intenção, já que todas as propostas tem custos, mas apenas poucas benefícios reais.

Minha conclusão:

Como não há evidências de haver correlação entre tamanho da população e quantidade de gás carbônico e, como discuti anteriormente, planejameto familiar para populações com baixo desenvolvimento parece algo conceitualmente imcompatível, acredito que proposta como essa ou seja resultado de certa "miopia" ou da tentativa de implantar controle de natalidade sob o rótulo mais aceitável de "planejamento familiar". Assim, eu não apoio.



Abs,
Fred
[1]http://en.wikipedia.org/wiki/List_of_countries_by_population
[2]http://en.wikipedia.org/wiki/List_of_countries_by_carbon_dioxide_emissions
[3]
Pais;populacao;co2
China;1;1
India;2;4
EUA;3;2
Indonesia;4;19
Brasil;5;17
Paquistao;6;31
Bangladesh;7;65
Nigeria;8;39
Russia;9;3
Japao;10;5
Mexico;11;12
Filipinas;12;48
Vietna;13;37
Alemanha;14;6
Etiopia;15;110
Inglaterra;22;7
Canada;36;8
Coreiadosul;25;9
Italia;23;10
Australia;51;16
Irã;17;11
Mexico;11;12
Africa do sul;26;13
Franca;20;14
Arabia Saudita;46;15

[4]
Pearson's product-moment correlation
data: data$populacao and data$co2
t = -0.439, df = 23, p-value = 0.6647
alternative hypothesis: true correlation is not equal to 0
95 percent confidence interval:
-0.4693860 0.3153264
sample estimates:
cor
-0.09116298
_____________________________________________
Spearman's rank correlation rho
data: data$pop and data$co2
S = 2304.887, p-value = 0.589
alternative hypothesis: true rho is not equal to 0
sample estimates:
rho
0.1135052


2 comentários:

Unknown disse...

Acredito que a forma correta de fazer o gráfico é colocar o número absoluto da população e o volume total de emissão de CO2. Neste caso a correlação vai ser alta, embora alguns países muito populosos como a Nigéria e a Etiópia, vão ter baixa emissão (devido à pobreza e ao baixo nível de desenvolvimento econômico). Evidentemente, o que mais influi na emissão da gazes de efeito estufa é o nível de produção e consumo, mas o tamanho da população também conta.

Fred disse...

Taquinho,
Obrigado pelo comentário!

Assim que tiver tempo coloco o gráfico com os valores absolutos para avaliarmos.

Entretanto, não vejo como isso poderia afetar o resultado. Para garantir, apliquei outro teste para detectar correlações, específico para correlação de "ranks". A correlação continua muito baixa ainda. O resultado desse novo teste foi incluído ao final do texto.

Ao mesmo tempo, veja que em postagem minha antiga (http://meuqwerty.blogspot.com/2008_01_01_archive.html) utilizei os ranks e a correlação não foi perdida.

De qualquer forma, assim que tiver um tempo adiciono o novo gráfico.

Grande abraço,
Fred